sábado, dezembro 29, 2007

Avôzinho

O meu avô Carvalhosa, pai da minha mãe, Noémia, era um jovem elegante, bonito, culto. Escrevia lindos versos, tocava banjo e bandolim, e cantava, com uma voz que diziam ser melodiosa e encantadora, o fado de coimbra.

Com estes atributos era, naturalmente, na segunda década do Séc. XX, um herdeiro muito cobiçado pelas inúmeras meninas que por ele suspiravam e quase desfaleciam a um sorriso seu ou a uma frase mais galante, fosse num descontraído piquenique na Serra de Montejunto, num serão passado em casa de alguma família do círculo de amigos, ou num baile de salão, numa das muitas quintas ainda habitadas pela aristocracia rural (em decadência social face à recém-constituída República, mas teimosamente resistente na manutenção dos seus usos e costumes).

Nos últimos dias deste ano de 2007 tenho-me lembrado dele com alguma frequência (e muita saudade). Não desse jovem garboso que, obviamente, não conheci, mas do meu "avôzinho", de coração puro e terno, com olhos de um azul muito claro que, agora, associo à transparência da sua alma e à generosidade do seu coração. Visitáva-nos diariamente, sempre com uma supresa no bolso, nem que fosse uma história nova, desencantada no seu vasto baú de recordações. De vez em quando também de lá saíam chocolates e outras guloseimas, porque, no fundo, ele bem conhecia a variedade de gostos da criançada...

Aqui lhe deixo uma sentida homenagem, através de uma fotografia que o retrata nos anos áureos de sedutor, e de um soneto de sua autoria publicado no jornal "O Alto Concelho de Alenquer", na mesma época.


VERSOS
Versos, quem os não lê com fé ardente,
com sacrosanto enleio e devoção?!
Soam tão docemente ao coração!
Versos... quem os não diz... quem os não sente?!

Porque se agita em nós, violentamente,
a alma, a crepitar como um vulcão,
ao ler d'esses Poetas a paixão
que vibra pelo espaço eternamente?!

Versos são preces loucas, desvairadas:
confidências subtis, apaixonadas,
repletas de fervor e de verdade!

E assim - quando a velhice se aproxima -
nós vamos evocando em cada rima,
uma cena feliz da mocidade.

Francisco Luiz de Carvalhosa (1926)

19 comentários:

Maria disse...

Que lindo, Maria!
A poesia presente na tua família há gerações, afinal.... natural que tua mãe e tu escrevam como escrevem...
Obrigada pela partilha, e um bom ano de 2008 para ti e tua família.

Beijos, um para a tua mãe.
(um abraço ao A. que te faz feliz...)

bettips disse...

O teu avô era lindo, com o ar da época!!! E estou a ver que o sangue real de artistas corre na família. Um belo poema a lembrá-lo e o ano ficou diferente.
Bjs, abraços e bons desejos para 2008!

bettips disse...

Não temos pressa, nem tempo.
Será como será, quando.
Eu sei.
Tenho infinita paciência para aqueles que amo. E acredito sempre em fadas...
AMOR e LIBERDADE para ti, Maria.
Abraços meus

bettips disse...

Hoje é dia 31, não farei
nem resumos
nem esperanças...
Fico. Assim.

mafalda disse...

Querida Maria,
Hoje passo apenas para te deixar votos de um excelente 2008!... e um beijo terno, é claro!

rui disse...

Olá Maria

Adorei o teu comentário.
Também te desejo um Feliz Ano Novo!
Que seja possível realizares muitos dos teus desejos.

Grande Abraço e beijinho

Maria P. disse...

Feliz 2008!

Beijinhos de Maio todo o ano*

Unknown disse...

Olá Maria,
Aqui aportei vinda de terras distantes...
Trazia na bagagem memórias e tantas outras histórias para contar...
Como foi ao chegar ter como recepção uma linda homenagem a um teu querido. Também tenho boas memórias que o Tempo jamais apagará. São elas que nos fazem crescer, que nos moldam nesta Sociedade em constante transformação. Mas tem algo que por mais que a Sociedade se transforme, nunca deixará de existir emoções...O Homem sentirá sempre o mesmo ao longo do tempo. Somente o que muda são as casas, as roupas e outras demais coisas...
O magnífico disso é encontrar nesta Paisagem Humana pessoas que marcam a diferença entre os demais...
E por isso mesmo, fazem crescer outros que andam perdidos na ilusão do dia-a-dia.
Desejo-lhe um ano de 2008 pleno de Sorrisos, de Vitórias, de Amor e de muitas Palavras...
Bem Haja Irmã da Palavra.
Beijo Ilda

Isamar disse...

Encontrei-te na Bettips e gostei tanto da tua escrita que não resisti a passar por aqui. Li um bocadinho mas , como sabes, hoje é dia de pressa.Voltarei mas tomei a liberdade de levar o teu link. Peço que me desculpes.

Desejo-te um Ano Novo muito feliz. Que a saúde seja a rainha , depois venha o rei amor e os príncipes amizade, alegria, solidariedade, paz...e por aí fora em cortejo real.

Beijinhossss

Menina Marota disse...

"Versos são preces loucas, desvairadas:
confidências subtis, apaixonadas,
repletas de fervor e de verdade!"

Uma linda homenagem que aqui prestas a teu Avô. Grata por assim o partilhares.

Não queria terminar este ano sem te deixar um grande abraço e desejar-te um FELIZ ANO NOVO e que2008 concretize os teus sonhos.

Um abraço carinhoso ;))

Luisa disse...

Lá no Alto o teu Avô com certeza sorriu feliz ao ver-se assim evocado por uma Neta. Que bonito rapaz ele era! E que bonitos os versos que fazia! Acho que são especiais as pessoas que vivem o presente ardentemente sem contudo esquecerem os que já se foram mas que ajudaram a moldar a sua personalidade. Feliz Ano Novo para todos.

Rosa dos Ventos disse...

Quem sai aos seus...
Um Bom Ano para ti e para todos os que amas!

Um abraço

Maria disse...

Um bom ano de 2008 para ti, querida Maria, com muita saúde e paz...
Beijos, distribui-os, por favor

M. disse...

Um bom ano para ti.

Graça Pires disse...

Maria, adorei o teu avô.
"E assim - quando a velhice se aproxima -nós vamos evocando em cada rima,uma cena feliz da mocidade". Como ele conhecia bem a finalidade da escrita para quem a escreve e para quem a lê.
Um beijo e bom 2008.

Besnico di Roma disse...

Gostei da sonoridade e das palavras desse soneto.
Versos quem os não lê…

APC disse...

Ui... Giraço e com palavrinhas sabidas, faço ideia, faço! ;-)

Anónimo disse...

Gostei imenso dos seus escritos, são belos e fizeram-me lembrar o senhor Carvalhosa de Aldeia Galega da Merceana e a sua filha e minha amiga Noémia que há anos não vejo.
continue a escrever sentido e dando aos outros a felicidade que lhe vai na alma. Obrigado fez-me sentir feliz.
padrejosericardo@sapo.pt

Maria Carvalhosa disse...

Senhor Padre Jos� Ricardo,

Em primeiro lugar, agrade�o-lhe os gentis coment�rios aos meus modestos textos que, na realidade, n�o correspondendo � minha actividade profissional, veiculam a forma de express�o em que me sinto mais realizada e feliz: a escrita.

Depois, queria transmitir-lhe o qu�o interessante veio a revelar-se este seu coment�rio, pelas raz�es que sabe, mas reservarei o que sobre isso tenho a dizer-lhe para um mail, que lhe enviarei em breve j� que, amavelmente, me deixou o seu endere�o.

Apresento-lhe os melhores cumprimentos.